PROPOSTA DE REFORMA TRIBUTÁRIA DESCONSIDERA CRISE DE EMPREGO E DE CONTRATAÇÕES SOBRE A FOLHA DE SALÁRIOS

O projeto apresentado pelo Senador Roberto Rocha não nos parece adequado para a solução dos problemas em torno da reforma tributária que o país precisa para a sua sustentabilidade econômica. Ele tem o mérito de trazer uma proposta sistematizadora de reforma tributária e de proporção uma solução importante para os passivos tributários da empresa – ao trazer à pauta o importante tema do novo Refis -, mas nem de longe promover o ajuste que o sistema precisa. Vejamos por quais razões:

Primeira, o projeto da PEC 110 não aborda o tema da desoneração da folha de salários. Em um momento de crise de emprego e de dificuldade econômica, não é justificável que a reforma trate de tributação de renda e consumo e não trate de tributação de folha, que é o que gera mais impacto sobre empregabilidade e benefícios para empregadores e empregados. Além disso, perder-se-á a oportunidade de dar solução para a tributação da economia digital, que apresenta alta empregabilidade e pouca receita para o cofre do INSS. A lacuna neste projeto é intransponível dos interesses sociais que sairão esquecidos e prejudicados.

Segunda, modificação do ICMS para um sistema complexo de IVA dual, no modelo europeu, é situação antiga já na Europa e que ainda hoje apresenta problemas. Melhor seria um sistema simplificador do ICMS, evitando guerra fiscal de maneira mais simples, e sem ofender o pacto federativo, pois nenhum sistema proposto os municípios sairão perdendo em termos de autonomia e arrecadação. A desoneração de produtos importantes será definida por lei complementar, mas, atualmente, em um país de dimensões continentais e desigualdades regionais aguda, os Estados não podem perder a liberalidade de conceder incentivos à luz de necessidades e interesses específicos.

Terceira, a necessidade de lei complementar coibirá medidas de incentivos mais eficazes e autônomas pelos Estados, que, a seu turno, perderão a conexão com a realidade dos contribuintes e consumidores de certas regiões mais carentes. A essencialidade de produtos certos, inclusive da cesta básica, não pode deixar de ser referência para incentivos fiscais.

Esses três aspectos fundamentais são suficientes para provocar profundas reflexões acerca da pertinência de se apresentar o projeto com base em temas ainda não solucionados e sem levar em conta a crise de emprego e de contratações sobre a folha de salários no Brasil.

Isso sem se falar na ausência de dados e números que devem embasar qualquer discussão sobre reforma tributária. Nada foi apresentado nesse sentido. Não é possível dar um “cavalo de pau” abrupto no sistema tributário, promovendo mudanças tão grandes de forma brusca, sem uma discussão mais profunda com a sociedade, por meio de apresentação de números que calculam se haverá impacto ou benefício fiscal e quais os setores e segmentos da sociedade que serão beneficiados ou prejudicados.

O setor de serviços, por exemplo, que hoje paga 5% de ISS e 3,65 de PIS e Cofins, passará a pagar provavelmente (pois não há, pasmem, divulgação de alíquota real e precisa, o que torna o tema ainda mais “ perigoso ”à sociedade e aos contribuintes) 25% de IVA e 12% de Pis e Cofins. Será um aumento de mais de 300% da carga tributária atualmente suportada. Esse setor de serviços tem como principal insumo a mão de obra e não se proporá, ao que sabemos até agora, nenhum projeto de racionalização da tributação da folha, que poderia compensar esses aumentos absurdos de IVA e de PIS / Cofins, além de dar fôlego para as prestadoras de serviços se organizarem o melhor no ambiente de crise.

* Halley Henares Neto, Presidente da ABAT – Associação Brasileira de Advocacia Tributária

Acesso em: Política Estadão